sexta-feira, 31 de março de 2023

UMA ARTE, DE ELIZABETH BISHOP, POR IGOR BARBOSA

Só tomei conhecimento deste poema pela versão que Bruno Tolentino lhe fez e publicou no Mundo como idéia. Se uso a palavra versão é porque, embora Tolentino resgate para o vernáculo a matéria do poema original é, sem dúvida, outro poema que compôs sobre o mesmo motivo. E não sou eu que o digo, é o mesmo poeta que, entre parênteses, acrescenta um subtítulo, "Uma arte toda sua"; depois li as traduções de Paulo Henriques Brito e de Nelson Ascher. Agora, saindo do forno, ou melhor do whatsapp de  Igor Barbosa, esta tradução cuja qualidade e força poética renova o interesse de quem lê poesia. É ocioso dizer que uma nova tradução de um mesmo poema não é como ler um mesmo poema várias vezes, posto que isso seja também uma experiência enriquecedora que nos mostra desse poema algo que se não percebeu nas leituras anteriores, é algo como ouvir um concerto executado por diversos maestros, que é o mesmo e também carrega a assinatura pessoal de cada regente.


Nada dificultosa é a arte de perder;
tantas coisas contêm a própria perdição
que, uma vez perdidas, mal fazem sofrer.

Perde algo todo dia, aceita que vais ter
chaves de casa e horas fugindo-te às mãos;
Nada dificultosa é a arte de perder.

Pratica, então, mais vezes e melhor perder;
lugares, nomes, e o destino ao qual não
chegaste. Tudo isso pouco faz sofrer.

Perdi o relógio de mamãe. E até, vem ver,
a última ou quase última habitação.
Nada dificultosa é a arte de perder.

Duas cidades que amei não vou mais ter,
reinos que possuí, dois rios, uma nação.
Suspiro, mas tudo isso pouco faz sofrer.

- E mesmo te perder (a voz risonha, o ser
que eu amo). Eu não devo mentir. Claro que não
é tão dificultosa a arte de perder,
mesmo que (Escreve!) assim te possa parecer.