Este
é um trecho do conto "O jardim secreto", do volume A inocência do padre Brown, em tradução, sem nenhum exagero, belíssima de Carlos Nougué, publicada pela editora Sétimo Selo, em 2006.
Essa passagem, que poderia ser
tomada como mera enumeração e apresentação dos convidados do chefe de polícia
de Paris, Valentin -- um antípoda do pequeno sacerdote, algo como o lado materialista da lei -- chamou-me atenção desde a primeira leitura. Padre Brown é a
um só tempo uma inteligência certeira e desconcertante e uma presença física,
dir-se-ia, opaca, ou como foi dito em "Cruz azul", "diminuto
simplório" ou, ainda, "um tipo de homem que qualquer pessoa pode
levar por um barbante até o Pólo Norte".
O curioso é que no presente conto
é o único que não conta com descrição detalhada que mereceram outras
personagens. É simplesmente apresentado como de "Cobhole, Essex, a quem
conhecera na Inglaterra". Com isso, a sugestão visual é interessantíssima,
uma vez que percebemos como o policial francês olha demoradamente para cada
convidado, a ponto de apreender-lhes os pormenores físicos e psicológicos, mas
quando passa por Brown, a simples brevidade da descrição faz-nos perceber que
seu olho quase o ignora, quando muito o detecta, e assim um recurso
aparentemente tão simples descreve certa arrogância esclarecida de Valentin e
certo sentimento de rivalidade em relação àquela figurinha de preto, quieta no
seu cantinho, humilde e indiferente à exuberância artificial que o rodeia, o
que comunica imediatamente com o final do conto anterior, o já aludido "Cruz azul", em que ele, "um
padreco de Essex", em vez de prestar atenção à reverência de seus dois
rivais -- o detetive esclarecido e o criminoso Flambeau que teve suas intenções reveladas -- ou comover-se ou envaidecer-se com ela, "olhava em volta à procura de seu guarda-chuva".
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